MPF X SBTVD-T: já é hora de virar a página?

A ausência de informação e de mobilização em torno dos desdobramentos da Ação Civil Pública proposta pelo Ministério Público Federal no Estado de Minas Gerais, em 17 de agosto de 2006, pleiteando a anulação do Decreto 5820/2006, é o maior indício de que os próximos anos serão difíceis e demandarão uma ação tão articulada quanto firme em prol da comunicação democrática no país. 

Em síntese, o documento de 56 páginas traz as seguintes alegações para reivindicar a revogação do Decreto: 

– aquisição do mais caro dos receptores dentre os testados, implicando na diminuição de domicílios atendidos; 

– revogação implícita do Decreto 4901/2003, pela ausência de efetiva colaboração entre o Comitê de Desenvolvimento e o Comitê Consultivo, além da ausência da divulgação de um relatório final do Comitê de Desenvolvimento contendo a fundamentação que motivou a escolha do padrão japonês de TV Digital; 

– ofensa ao artigo 223 da Constituição ao permitir o uso privado de um bem público, referindo-se à consignação de canais de radiofreqüência para as emissoras atuais, “a fim de permitir a transição para a tecnologia digital sem interrupção da transmissão de sinais analógicos” (conforme artigo 7º do Decreto 5820/2006); 

– incompatibilidade entre oferta de interatividade e explícita separação entre setores de radiodifusão e telecomunicações no país, com base na Emenda Constitucional n.º 08/95; 

– inviabilidade da entrega de 6 megahertz adicionais às emissoras, que contariam com maior espaço no espectro para viabilizar suas programações e/ou estabelecer novos negócios; 

– impropriedade de estabelecer o SBTVD via Decreto, sendo mais adequada a aprovação de uma Lei pelo Congresso Nacional, com posterior sanção ou veto por parte do Presidente da República; 

– impossibilidade de transmissão em HDTV pelas concessionárias, no período de transmissão simultânea analógica e digital, na medida em que inviabilizaria políticas públicas de incorporação da digitalização por parte de experiências comunitárias e locais. 

Apesar de justificar, ao longo do texto, a procedência da competência de levar uma ação de âmbito nacional para Minas Gerais, o Juiz Lincoln Pinheiro Costa indeferiu a petição inicial alegando ser o pedido formulado juridicamente impossível e considerando a causa inepta, na medida em que o pedido motivado pelo dano não é da esfera do Tribunal Regional Federal, mas sim do Supremo Tribunal Federal, cabendo para tanto uma ação nessa esfera. 

A justificativa tecnicamente plausível por parte do Juiz do TRF teve também a motivação da visita pessoal de Hélio Costa a Belo Horizonte para uma conversa na semana anterior à decisão, conforme noticiado na mídia. Do ponto de vista político, por sua vez, o Ministro publicou uma exposição de motivos insatisfatória em relação às questões levantadas. 

No entanto, a estranheza maior é que desde então não mais se ouve a mobilização nem das organizações da sociedade civil em torno do assunto e nem mesmo do próprio MPF, que apresentou a ação. Será que realmente o cenário que se coloca é o de virar a página e buscar garantir uma regulação na qual sejam contemplados os interesses e necessidades da população? Se existe um mérito ainda não refutado objetivamente nas reivindicações expostas pelo MPF cabe persistir na busca de caminhos possíveis pelos quais a sociedade possa valer seus direitos, buscando forças legítimas que gritem em nome dos excluídos da comunicação democrática.

 

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