Reportagens não têm de ser fundamentadas com a mesma clareza que se exige dos juízes em uma sentença condenatória. Graças a esse entendimento do Tribunal de Justiça de São Paulo a Editora Abril se livrou de indenizar o comerciante libanês Assad Ahmad Barakat por tê-lo chamado de terrorista em reportagem publicada pela revista Tudo , com o título: 'Guerra: terrorista brasileiro'.
A revista afirmou que Barakat seria membro de organização terrorista e que era procurado por suspeita de enviar dinheiro para a rede Al-Quaeda, comandada por Osama bin Laden.
A 4ª Câmara de Direito Privado do TJ paulista analisou se o título da reportagem implicava prejulgamento da conduta do comerciante, que teria sido considerado criminoso sem condenação definitiva. A turma julgadora, por maioria de votos, entendeu que não houve nenhum ato ilícito na reportagem e que a revista agiu no estrito dever de divulgar assunto de interesse público.
Em primeira instância, a Editora Abril havia sido condenada a pagar indenização de R$ 30 mil por danos morais. O juiz que assinou a sentença argumentou que a notícia era injuriosa. Para ele, a revista divulgou como fatoconsumado a investigação sobre suposta ligação do comerciante com uma rede terrorista.
A empresa recorreu ao Tribunal de Justiça contra a sentença alegando que a notícia foi legítima, feita no exercício do direto de informar. A tese foi acolhida. Para os desembargadores, não ocorreu abuso no exercício do direito de informação porque o fato da notícia seria verdadeiro. Barakat era considerado membro da organização terrorista e estava radicado na região da tríplice fronteira (Argentina-Brasil-Paraguai).
'Não devemos exigir que o jornalista emita nota com o mesmo grau de clareza que o juiz exige para pronunciar uma sentença condenatória', disse o desembargador Ênio Zuliani. 'A imprensa reproduziu os acontecimentos, não tendo fantasiado a ocorrência, distorcido a situação ou simulado episódio, o que afasta a tese de lesão a direitos individuais do cidadão', completou.
'A liberdade de imprensa não exime os jornalistas do dever de cautela no preparo de toda a notícia que será veiculada, inclusive do título da mesma', contestou o desembargador Francisco Loureiro, que defendeu que o comerciante tinha direito ao pagamentode indenização por dano moral.
Para Loureiro, 'o princípio da liberdade de imprensa deve ser exercitado com consciência e responsabilidade, em respeito à dignidade alheia. Não é tolerável que a apelante tenha se referido ao autor na Revista Tudo de forma tão imprudente, estampando sua fotografia, e se referindo a ele como ‘terrorista brasileiro’, sem haver condenação transitada em julgado'.
Em seu voto, Francisco Loureiro defendeu o pagamento da indenização na metade do valor estabelecido em primeira instância. Sustentou que a quantia era suficiente para cumprir o duplo papel de punir a revista pela lesão causada ao comerciante e compensar a vítima, sem provocar enriquecimento sem causa. Ficou vencido pelos votos de Ênio Zuliani e Jacobina Rabello.
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