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Deputados querem aditar contratos com rádios e TVs

Na última reunião do ano da Comissão de Ciência, Tecnologia, Comunicação e Informática (CCTCI) da Câmara dos Deputados, realizada nesta quarta-feira (16), os parlamentares aprovaram inédito pedido de acréscimo de novas obrigações aos contratos de concessão de rádio e TV. A novidade quebra a lógica vigente há anos no Congresso. Os parlamentares das comissões que analisam pedidos de outorga e renovação de concessões de rádio e TV limitavam-se apenas a chancelar os processos vindos do Executivo, em uma prática de renovação quase automática das licenças para operação de serviços de radiodifusão.

O documento, apresentado pela deputada Luiza Erundina (PSB-SP), traz a indicação de seis novos pontos a serem atendidos pelos concessionários. Como a instituição do contrato é uma prerrogativa do Executivo Federal, o texto apenas aponta ao Ministério das Comunicações um conjunto de exigências que devem agora ser traduzidas em cláusulas adicionais aos contratos.

A indicação central do requerimento que será enviado ao Minicom é a introdução de artigos que estabeleçam obrigações de cumprimento dos dispositivos constitucionais referentes à comunicação social, especialmente a preferência à programação de finalidades educativas, culturais, artísticas e jornalísticas. O texto também recomenda o estabelecimento, no contrato, de percentuais mínimos de conteúdos jornalísticos e educativos, bem como de produção regional e independente.

Outra norma constitucional a ser traduzida em uma cláusula seria a proibição de práticas de monopólio e oligopólio. O texto sugere um controle sobre a propriedade cruzada (quando um grupo detém um jornal, rádio ou TV) e sobre os limites estabelecidos em lei. O objetivo é combater situações como as do bispo Edir Macedo, controlador direto e indireto de três emissoras no estado de São Paulo, ou a de redes que usam diversos familiares ou laranjas para diferenciar quadros acionários quando, na verdade, detêm emissoras acima do máximo permitido pela legislação.

Uma inovação foi a recomendação do "estabelecimento de conselhos de telespectadores e ouvintes", que teriam o dever de "divulgar, periodicamente, análises críticas sobre a programação das emissoras de rádio e de televisão". A justificativa apresentada pela deputada é a necessidade de ampliar a participação da sociedade no que é produzido pelas emissoras, uma vez que a exploração de canais de rádio e TV é um serviço público.

Por último, o documento prevê que os concessionários mantenham a regularidade fiscal durante todo o período da outorga. A idéia é que a avaliação sobre as dívidas com a União não seja realizada apenas de 15 em 15 anos, o que permite aos licenciados contraírem diversos débitos junto ao Estado e aos trabalhadores de suas empresas.

Avanço na democratização do setor

A deputada Luiza Erundina destaca que a Indicação (documento do Legislativo com sugestões ao Executivo) avança nas mudanças do sistema de outorgas de rádio e TV previstas no relatório final da subcomissão sobre os atos de outorga de radiodifusão aprovado no mês passado pela CCTCI [ver aqui]. "O processo como um todo, que partiu do relatório e passou pela realização de uma audiência pública para discutir a renovação das outorgas vencidas em 2007 foi uma vitória. Ele reforça uma mudança de prática que mostra a necessidade de um mínimo de discussão sobre as renovações destas concessões", avalia.

Para Carolina Ribeiro, do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social, a Indicação aprovada concretiza uma luta histórica por mudanças no setor de radiodifusão, ao transformar várias demandas progressistas defendidas por diversas organizações em obrigações que de fato que poderão ser fiscalizadas e cobradas. "Ela dá mais um passo rumo ao cumprimento da lei e da possibilidade de participação social, uma vez que sugere ao Ministério das Comunicações que inclua no contrato com as emissoras o cumprimento de dispositivos constitucionais, como a exigência da regionalização e da produção independente (previstas no artigo 221), e a criação de mecanismos de participação da sociedade.”

Próximos passos

Os deputados e as entidades apoiadoras das recomendações deverão agora cobrar do ministério que acate as sugestões nos próximos contratos, começando pelas várias emissoras cujas outorgas venceram em 2007 e estão em análise no órgão. Segundo Luiza Erundina, serão solicitadas reuniões junto ao Minicom para detalhar as propostas e traduzi-las em cláusulas para serem inclusão no contrato. As emissoras também serão procuradas, para construir um entendimento sobre a importância da medida.

Segundo Erundina, no próximo ano, os parlamentares da CCTCI também deverão se dedicar ao encaminhamento das demais proposições do relatório. Entre elas está um Projeto de Lei para qualificar os critérios para a outorga e renovação de licenças e um pedido de fiscalização e controle para que o Tribunal de Contas da União realize uma auditoria operacional no Ministério das Comunicações para avaliar os processos de concessão de licenças.

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‘Arrendamento’ evidencia uso indevido de outorgas de TV

Ao sintonizar qualquer canal da Rede Bandeirantes no horário nobre, por volta das 21h, será possível ver o “Show da Fé”, comandado pelo missionário R. R. Soares. O programa da Igreja Internacional da Graça de Deus não é uma produção própria da emissora, tampouco uma produção independente que o grupo adquire pela sua qualidade, mas sim um dos expoentes de um novo fenômeno que vem se tornando uma prática corrente por parte de várias TVs: o arrendamento de espaços na programação.

Segundo dossiê preparado pelo Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social a partir de denúncias produzidas por diversas entidades da sociedade civil [ver aqui ], este tipo de “negócio” constitui um uso indevido e abusivo das concessões públicas de radiodifusão. “O arrendamento parcial ou total contraria totalmente o espírito da lei”, dispara o documento.

A afirmação baseia-se no fato das emissoras estarem tomando para si uma prerrogativa do Estado de conceder a outorga, ou seja, definir quem pode utilizar um canal do espectro eletromagnético (por onde são transmitidos os sinais de rádio e TV) para distribuir uma programação. Com o arrendamento, são as emissoras – e não a União – que decidem quais empresas ou organizações podem acessar parte do tempo do canal cuja exploração foi dada a elas, concessionárias, somente.

Outro problema grave é o fato de uma concessionária fazer uso de um bem público, o espectro eletromagnético, para obter lucros deixando de prover o serviço objeto da concessão, no caso, a programação de TV.

O texto sustenta que o aluguel de espaços na programação deve ser considerado inválido mesmo que não haja uma proibição expressa no arcabouço legal da comunicação social eletrônica. Na avaliação dos signatários do dossiê, a legislação brasileira relativa à concessão de serviços públicos deve ser utilizada como parâmetro para demonstrar a omissão flagrante nas normas específicas que disciplinam a radiodifusão.

“A comparação com as outras concessões públicas – em que a subconcessão só é permitida se prevista no contrato, autorizada pelo poder concedente e antecedida de concorrência pública – nos permite dizer que o silêncio da lei de radiodifusão sobre a matéria não deve ser entendida como um consentimento, mas como uma não autorização”, argumentam os autores do documento.

Para ser coerente com a normatização dos serviços públicos, a prática do aluguel de espaço de programação, conclui o dossiê, só poderia ser admitida caso houvesse autorização do Executivo Federal e os locadores fossem escolhidos por meio de uma concorrência pública com normas e critérios rígidos e objetivos.

Ocupação a serviço de Deus

O principal locador de espaços na programação são os grupos religiosos católicos e evangélicos. De acordo com o dossiê entregue pelas entidades, a Rede Bandeirantes repassa 7 horas e 30 minutos de seu tempo diário para a Assembléia de Deus e à Igreja Internacional da Graça de Deus, sendo 5 horas e 30 minutos para a primeira e 2 horas para a segunda. O Canal 21, também do grupo Bandeirantes, recentemente passou a arrendar 22 horas diárias de sua programação à Igreja Mundial do Poder de Deus.

Segundo nota da coluna do jornalista Daniel Castro na “Folha de S. Paulo” em 18 de setembro deste ano, a “campeã” do aluguel a igrejas é a Rede TV!, que subloca 58 horas semanais a este tipo de organizações.

A Record aluga seis horas da sua programação à Igreja Universal do Reino de Deus. No entanto, a rede deve ser vista de maneira diferenciada das anteriores, uma vez que é o próprio dirigente máximo da igreja, bispo Edir Macedo, quem decide o que vai ao ar na Record. Ou seja, o arrendamento, neste caso, configura-se como uma trama ainda mais complexa no jogo de burlar a legislação que caracteriza os contratos de aluguel de espaço na TV.

Os retornos obtidos pelas emissoras são bastante altos e contribuem fortemente na cesta de receitas mensais. De acordo com Daniel Castro, o arrendamento do Canal 21 à Igreja Mundial do Poder de Deus deve render R$ 420 milhões nos próximos cinco anos. Já a locação da 5 horas e meia na Band pela Assembléia de Deus custará R$ 336 milhões por quatro anos. Ainda na Band, o espaço alugado por R.R. Soares injeta nos cofres da emissora R$ 5 milhões por mês.

Estado laico, mídia laica?

Para o professor aposentado da Universidade de Brasília (UnB) e pesquisador da área Venício Lima, além do problema do arrendamento, o aluguel de espaços nas programações de redes por grupos religiosos também coloca dúvidas sobre a legitimidade da presença deste tipo de organização na radiodifusão.

“Um serviço público que, por definição, deve estar “a serviço” de toda a população, pode continuar a atender interesses particulares de qualquer natureza – inclusive, ou sobretudo, religiosos? Ou, de forma mais direta: se a radiodifusão é um serviço público cuja exploração é concedida pelo Estado (laico), pode esse serviço ser utilizado para proselitismo religioso?”, questiona no artigo “Estado laico e radiodifusão religiosa”, publicado no “Observatório da Imprensa” em 23 de setembro de 2008.

Na avaliação de James Görgen, coordenador do projeto Donos da Mídia, a resposta é negativa. “É flagrante o desrespeito das empresas que loteiam sua grade de programação para a transmissão de programas religiosos ou de televendas em relação ao Regulamento dos Serviços de Radiodifusão (Decreto 52.795/63) e à Constituição Federal de 1988, que prevêem finalidades informativas, educativas, artísticas e culturais para os canais de rádio e TV”, diz o pesquisador. E completa: “Portanto, não há previsão de uma finalidade religiosa – seja católica, evangélica ou neopentecostal – para a programação de ambos os serviços. É quase surrealista o fato de existirem vedações a esse conteúdo e mesmo assim termos pelo menos dez redes nacionais de televisão no país dedicadas exclusivamente à transmissão de conteúdo religioso.”

Ocupação a serviço das vendas

Outro ente que vem ocupando as grades de programações das emissoras são os grupos que vendem produtos pela televisão. Segundo levantamento realizado pelo Intervozes coordenado por Diogo Moyses, São Paulo é um dos espaços onde isso ocorre de maneira intensa. A Bandeirantes aluga, aos sábados pela manhã, 3 horas para uma das empresas que realizam este tipo de negócio. Já a TV Gazeta veicula, mediante locação, o programa Best Shop por 2 horas e 30 minutos todas as manhãs e 5 horas e 30 minutos durante as madrugadas.

Mas a emissora com maior incidência é a Mix TV, que ocupa sua grande com os chamados “infomerciais” durante 20h. Em seguida vem a RBI, que arrenda 15 horas para shows de televendas. Na avaliação das entidades signatárias do dossiê, apresentado na audiência sobre renovação das concessões de rádio e TV realizada na Câmara em novembro, a sublocação de espaços para vendas de produtos deve ser entendida como negociação de espaço publicitário.

Neste caso, ele deve ser considerado ao avaliar o limite máximo de 25% do tempo diário para este tipo de conteúdo presente no Regulamento dos Serviços de Radiodifusão. Caso o Ministério das Comunicações tivesse disposição em realizar de fato este tipo de fiscalização, fica evidente o desrespeito a este limite seja daqueles canais que veiculam mais do que 25% do seu tempo com infomerciais, seja naqueles que ultrapassam o limite somando televendas e anúncios publicitários ordinários.

Na avaliação de Diogo Moyses, os contratos de aluguel de espaços para empresas de televendas incorre em três ilegalidades: sublocam a grade de programação, extrapolam o limite permitido de publicidade e não cumprem a determinação constitucional de dar prioridade às finalidades culturais, educacionais e informativas. “Além de ilegal, é algo absolutamente imoral”, afirma.

Para ele, a difusão cada vez maior deste tipo de prática mostra a ausência crônica de regulamentação e fiscalização nas comunicações brasileiras. “O aluguel da grade de programação das emissoras é um dos maiores símbolos do descontrole absoluto do Estado sobre a exploração do serviço”, avalia. “O mais grave é que o Ministério das Comunicações, que deveria fiscalizar as emissoras, finge que não é com ele. Com isso, ser concessionário de radiodifusão, além de um negócio lucrativo, tornou-se extremamente fácil: basta ter obter a outorga e lotear os horários da emissora. Quem não gostaria de ter um negócio desses?”, questiona.

A espera de providências

O conjunto de denúncias apresentado na audiência foi protocolado na Comissão de Ciência, Tecnologia, Comunicação e Informática (CCTCI) da Câmara dos Deputados, no Ministério das Comunicações e entregue ao representante do Ministério Público e do Tribunal de Contas da União presentes ao encontro. Resta saber se, com tão flagrantes desrespeitos e ilegalidades, serão tomadas providências por parte destes órgãos.

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CCTCI aprova propostas de modernização na legislação

O que parecia pouco provável aconteceu. O relatório da subcomissão destinada a analisar os procedimentos de outorga e renovação dos serviços de radiodifusão da Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática (CCTCI) da Câmara dos Deputados foi aprovado nesta quarta-feira (3) pelo plenário na Comissão. O documento contém propostas avançadas de democratização e garantia de maior transparência nos processos de concessões de rádio e TV, que vinham sendo alvo de intensas resistências por parte dos empresários de radiodifusão e dos parlamentares ligados a este setor.

O texto, elaborado pela deputada Maria do Carmo Lara (PT-MG), traz alterações concretas nos procedimentos de análise das outorgas, sugere mecanismos e iniciativas com vistas à melhoria das ações de fiscalização e recomenda mudanças legislativas em vário instrumentos que regulam a radiodifusão, sugerindo inclusive que sejam revistos dispositivos constitucionais.

O conjunto de iniciativas, alterações e medidas citadas no relatório reflete demandas de diversos setores da sociedade civil organizada, cuja penetração nas esferas de poder na área das comunicações tem sido, até hoje, muito pequena. Várias delas são bandeiras da Campanha Nacional por Democracia e Transparência nas Concessões de Rádio e TV, iniciativa que reúne diversos movimentos e entidades da área. [Veja também: "Entidades denunciam Estado e emissoras por irregularidades"]

Agora, passada a difícil tarefa de aprovação do relatório, coloca-se o ainda mais hercúleo trabalho de levar à cabo suas recomendações. “Foi muito importante a aprovação do relatório, mas ele só vai produzir efeitos a partir do encaminhamento concreto das suas recomendações”, reforça a presidente da subcomissão, deputado Luiza Erundina (PSB-SP). Passo importante nesta direção foi dado pela própria CCTCI, que aprovou também a manutenção da subcomissão exatamente para que esta monitore a aplicação das medidas contidas no relatório aprovado.

Resistências e polêmicas

Quando isso ocorrer, no entanto, as resistências devem ficar mais explícitas. Espera-se, por exemplo, que as sugestões de revisão de alguns artigos constitucionais suscitem disputas acirradas entre os defensores de mudanças nos marcos regulatórios e os interesse particulares estabelecidos no setor.

No topo da lista das potenciais polêmicas está a sugestão de que os parlamentares aprovem uma Proposta de Emenda Constitucional que "expressamente proíba que parlamentares sejam proprietários, controladores, diretores ou gerentes de empresa de radiodifusão sonora e de sons e imagens", vedação também estendida a qualquer ocupante de cargo público. A relatora justifica a medida afirmando ser a propriedade e direção de emissoras por parlamentares incompatíveis "com a natureza do cargo político e o controle sobre concessões públicas, haja vista o notório conflito de interesses".

Privilégios contestados

Outras PECs sugeridas pelo relatório e que também mexem em pontos considerados fulcrais pelos radiodifusores são a revogação dos parágrafos 2o e 4o do Artigo 223 da Carta Magna. O primeiro estabelece que a não renovação de uma outorga de rádio ou TV ocorra somente com 2/5 dos congressistas negando a nova autorização em votação nominal. Esta previsão cria uma exigência que, na prática, assegura uma blindagem à possibilidade dos parlamentares vetarem a renovação de uma outorga. "Considerando que nem mesmo as leis ordinárias demandam quorum qualificado e votação nominal para aprovação, não há como justificar a preservação desse privilégio, que, ressalte-se, é garantido somente às concessionárias e permissionárias de rádio e televisão", argumenta a relatora.

Já o artigo 4o estipula que apenas o Poder Judiciário tem a prerrogativa de cancelar uma outorga de rádio e TV. Ao restringir a possibilidade de cassação das licenças, tal exigência dá estabilidade aos concessionários e cria certo clima de impunidade. A relatora recomenda a retirada deste dispositivo do capítulo Da Comunicação Social da Constituição Federal, por identificar nele um privilégio injustificável, não existente no caso de nenhum outro serviço público.

O documento também discute a regulamentação do artigo constitucional que proíbe a prática de monopólio e oligopólio. Segundo o relatório, a legislação atual é insuficiente porque estabelece limites apenas em relação ao número de emissoras que uma mesma pessoa física ou jurídica pode controlar. Maria do Carmo Lara defende a aprovação do Projeto de Lei 4.026/2004, do deputado Cláudio Magrão, que institui o critério do limite máximo de 50% de audiência para a caracterização de monopólio ou oligopólio.

Critérios de análise

Além das revisões e regulamentações constitucionais, o relatório da subcomissão propõe também um Projeto de Lei para modificar os critérios utilizados na análise de outorgas e renovações.

Nas licitações para concessões de finalidade comercial, seria dado mais peso às propostas sobre "programas jornalísticos, educativos e informativos” e sobre “serviço noticioso". Seriam exigidos, também, "percentuais mínimos de regionalização da produção cultural, artística e jornalística e de produção independente a serem cumpridos pela emissora vencedora". A valorização dos aspectos de programação na definição das concorrências por um canal implicaria em uma redução da importância dos critérios técnicos e de preço, quesitos que reforçam a predominância do elemento econômico na escolha dos concessionários nas licitações. [Veja também: "Poder econômico determina quem ganha licitações de canais"]

Em relação às permissões para rádios e TVs educativas, o PL prevê que este serviço seja explorado por órgãos da União Federal, Estados, Distrito Federal, Municípios e universidades brasileiras. Apenas onde não houver o interesse destes entes, seria permitida a outorga de uma autorização a fundações privadas, "desde que seja demonstrada vinculação da entidade com instituição de ensino". [Veja também: "Decisão da Justiça questiona falta de licitação para outorgas"]

O projeto também visa ampliar a participação da sociedade neste momento inicial na escolha dos operadores de canais de rádio e TV. Para isso, prevê a realização de consulta pública antes da abertura do processo de licitação para colher as expectativas da população.

Mudanças imediatas

O relatório também apresenta medidas de caráter imediato para o aperfeiçoamento dos procedimentos adotados pelo Ministério das Comunicações na análise das outorgas de radiodifusão. Ele reforça as sugestões já constantes em sua versão parcial, aprovada em julho de 2007, como a publicização dos dados sobre os processos e a fixação de prazos uniformes e razoáveis para cumprimento das exigências pelas emissoras.

O texto aprovado agora também ressalta a obrigação das concessionárias manterem a regularidade fiscal durante todo o período da outorga e a necessidade de se agilizar a tramitação dos processos, com a redução da burocracia e a reabertura das delegacias regionais do Ministério das Comunicações. Por fim, como na sua versão anterior, o relatório prevê a criação de mecanismos de controle social para avaliar periodicamente o cumprimento dos preceitos constitucionais e exigências legais referentes à exploração destes serviços.

Em sua versão final, o relatório aprofunda duas indicações ao Minicom. A primeira delas visa melhorar o controle e a fiscalização da sociedade sobre os procedimentos. Para isso, deveria ser criada uma "estrutura administrativa descentralizada responsável pelo acompanhamento permanente da prestação dos serviços de radiodifusão, com a participação não somente de servidores do Ministério das Comunicações, mas também de entidades representativas da sociedade civil e das comunidades locais".

Além deste mecanismo, o texto recomenda "o estabelecimento de um canal multimídia no Poder Executivo para que o cidadão possa encaminhar denúncias de irregularidades na prestação dos serviços de rádio e televisão e apresentar sugestões para aperfeiçoamento da regulamentação, procedimentos e atividades pertinentes à radiodifusão comercial e comunitária".

As medidas elencadas no documento não se limitam apenas a mudanças no sistema, mas em uma avaliação densa sobre como este funciona hoje. Para isso, a relatora sugere uma auditoria operacional no Ministério das Comunicações, na Presidência da República e na Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) sobre os procedimentos de análise de outorgas e renovações de concessões, permissões e autorizações.

A iniciativa tem como objetivo verificar o cumprimento dos dispositivos legais e constitucionais, bem como as sanções decorrentes do seu desrespeito; avaliar a transparência, impessoalidade e eficiência do trâmite dos processos e analisar os procedimentos de verificação de denúncias. Esta auditoria seria feita de forma conjunta com o Tribunal de Contas da União.

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Comissão pode votar relatório sobre regulamento de radiodifusão em breve

A Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática (CCTCI) da Câmara dos Deputados vai tentar votar, na próxima semana, o relatório com propostas de mudanças nas regras de renovações das outorgas de serviços de radiodifusão, elaborado pela deputada Maria do Carmo (PT-MG). A decisão foi tomada hoje (27) pelo deputado Walter Pinheiro (PT-BA), que preside a comissão, durante audiência pública sobre o tema. Ele defende que sejam tomadas as providências necessárias para transparência e regulação dos processos de renovação das concessões, que não dependam da mudança da Lei da Radiodifusão, de 1962, considerada por todos como totalmente anacrônica, mas que sua atualização enfrenta forte resistência dos donos de emissoras de rádio e televisão.

Os pontos mais polêmicos do relatório são a proibição de propriedade de emissoras de TV e rádio para qualquer detentor de cargo eletivo e o fim da exigência de decisão judicial para cancelamento ou cassação de outorga das emissoras. Além disso, Pinheiro defende uma maior atuação do Ministério das Comunicações na fiscalização das condicionantes da concessão previstas na Constituição, como o tempo máximo de 25% da programação diária destinada à publicidade e a proibição de venda de horário para programas independentes que, na sua opinião, caracterizam a terceirização da concessão, prática não prevista na legislação.

Críticas como a falta de transparência, o excesso de burocracia e a demora para apreciação dos processos de outorgas, atribuídas ao Minicom, foram gerais. Os radiodifusores, mais uma vez, foram culpados de impedir a modernização do marco regulatório do setor e da realização da Conferência Nacional de Comunicação que, na opinião dos deputados da comissão, é o palco ideal para debater todos os temas ligados à radiodifusão.

Conferência

A deputada Luiza Erundina (PSB-SP) reforçou a importância da realização da Conferência de Comunicação e criticou o governo por não propor sua realização. "Somente com um grande debate nacional poderemos aprimorar o marco legal da radiodifusão de forma a que atenda os interesses públicos", defendeu.

Para o deputado Jorge Bittar (PT-RJ), o processo de outorgas na radiodifusão deve seguir os mesmos critérios de transparência e publicidade feitos nas concessões de telecomunicações e energia elétrica. "Mas o que temos na radiodifusão é uma verdadeira caixa-preta", disse.

O deputado Fernando Ferro (PT-PE) também criticou os radiodifusores, afirmando que eles se organizam para impedir o debate da modernização da lei da radiodifusão, inclusive na própria comissão. "Esse debate é sempre um jogo de cartas marcadas e nós já sabemos para onde ele caminha", desabafou.

Entidades denunciam Estado e emissoras por irregularidades

Em outubro de 2007, venceram as concessões de importantes emissoras brasileiras de TV, entre as quais as cinco próprias das Organizações Globo e as "cabeças-de-rede" da Record e da Bandeirantes. O encerramento do prazo serviu de gancho para que várias entidades questionassem o sistema de outorgas no Brasil por meio da Campanha por Democracia e Transparência nas Concessões de Rádio e TV. A iniciativa reuniu movimentos sociais e organizações da área da comunicação em torno desta bandeira, mobilização que conseguiu dar aos processos um novo caráter, intervindo especialmente para evitar que as renovações fossem feitas de maneira automática e sem participação da sociedade, como historicamente tem ocorrido.

Como resultado da ação de entidades ligadas à campanha, foi realizada hoje (27) audiência pública na Comissão de Ciência, Tecnologia, Comunicação e Informática (CCTCI) da Câmara dos Deputados para debater a renovação das concessões vencidas em 2007 e o sistema brasileiro de outorgas de rádio e TV. Entre denúncias, questionamentos e propostas, prevaleceram as críticas ao Executivo, embora por motivos diferentes. Na ótica das entidades da sociedade civil e de parlamentares, o governo federal não fiscaliza os concessionários, permitindo que estes cometam abusos em relação à legislação e aos preceitos constitucionais.

Em um documento assinado por vários movimentos sociais e entidades [veja aqui ], as organizações questionaram por que o ministério não fiscaliza as exigências legais mínimas existentes hoje, como as restrições referentes à publicidade, o índice mínimo para programas jornalísticos e educativos e os limites de propriedade constantes no marco normativo do setor. "É inadmissível que o Ministério das Comunicações não fiscalize exigências básicas", contestou Jonas Valente, do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social.

José Soter, da Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária (Abraço) e do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), reforçou a crítica, evidenciando o tratamento diferenciado dispensado pelos órgãos reguladores às mídias comercial e comunitária. "Há uma fiscalização muito rígida em relação ao conteúdo das comunitárias e uma permissividade muito grande em relação as comerciais", disparou o ativista. "A área de fiscalização ainda está muito débil", reforçou o deputado Jorge Bittar (PT-RJ).

Empresários e ministério culpam burocracia

Os concessionários também criticaram o Executivo Federal, mas pelo excesso de burocracia. "As empresas por força de lei são obrigadas a entregar uma série de documentos e atender as exigências legais. Isso nem sempre é fácil, mas temos um prazo para cumprir", disse Deniz Munhoz, da Rede TV e representante da Associação Brasileira de Radiodifusores (Abra). "Desde os primeiros debates, citamos a demora nos processos de renovação e outorgas. Há necessidade de uma norma que se estabeleça um prazo para as autoridades responsáveis pela renovação", sugeriu Marcelo Cordeiro, da Rede Record.

O Consultor Jurídico do Ministério das Comunicações, Marcelo Bechara, concordou com os empresários. "O processo de renovação é extremamente burocrático. Ninguém tem dúvidas com relação a isso. Já passou da hora de termos uma uniformização dos procedimentos", afirmou. Para o representante do Minicom, a razão é a falta de estrutura do órgão. "O fechamento de delegacias no governo passado ainda pesa sobre os servidores. Todos os processos se concentram em Brasília", apontou.

“Falta vontade política”

José Soter contestou a justificativa de Bechara, indicando que a alegação da falta de estrutura seria uma desculpa para a fiscalização deficiente. "Por trás das causas alegadas, de falta de infra-estrutura, está escondida uma falta de vontade política para o Estado não exercer sua função", disse. Jonas Valente, do Intervozes, questionou, sem resposta, o porquê de um governo que tem realizado tantos concursos e criado novas estruturas não ter incrementado a estrutura do Minicom e sugeriu à CCTCI que faça uma audiência pública com o Ministério do Planejamento para discutir providências emergenciais referentes aos recursos físicos e humanos da pasta das Comunicações.

Marcelo Bechara anunciou que o ministério contratou a consultoria da Fundação Getúlio Vargas para modernizar procedimentos internos e, quiçá, apresentar propostas de reforma na legislação da área. Jonas Valente destacou que as propostas de mudanças, para irem ao encontro do espírito da audiência, precisariam ser submetidas a uma consulta pública, de modo a incorporar sugestões da população para que o sistema de outorgas de radiodifusão responda melhor aos seus anseios.

O documento de organizações da sociedade civil e de movimentos sociais também questionou o ministério pelo não encaminhamento de renovações até o encerramento do prazo da nova outorga, fato que teria resultado no arquivamento de 184 processos de rádios e TVs. Valente e Sóter criticaram fortemente a falta de transparência do Executivo nos processos de outorga, citando a falta de resposta do Ministério das Comunicações a um pedido de informações do Intervozes, da Central Única dos Trabalhadores (CUT) e da União Nacional dos Estudantes (UNE) sobre as concessões vencidas em 2007. As entidades anunciaram que entrariam com um Mandado de Segurança para obter as informações, mas Marcelo Bechara afirmou que o órgão disponibilizará as informações.

Obrigações e compromissos das emissoras

Para além da fiscalização, as entidades participantes da audiência propuseram novas obrigações para constar nos termos aditivos ao contrato de concessão, que deve ser assinado ao final do processo de renovação [veja aqui ]. Entre as propostas estão a “proibição de arrendamento ou subconcessão total ou parcial da outorga por parte do concessionário”; o cumprimento dos incisos II e III do artigo 221 da Constituição Federal, que prevêem um percentual de produção regional e estímulo à produção independente, em termos determinados pela Câmara dos Deputados; o estabelecimento de ouvidorias e Conselhos de Programação; a classificação da programação quanto ao gênero e a garantia de acessibilidade para pessoas com deficiência.

A deputada Luiza Erundina (PSB-SP), que propôs a audiência, manifestou-se favorável ao acréscimo de cláusulas no contrato das concessionárias. "O Decreto 52.795/63 [Regulamento dos Serviços de Radiodifusão] já estabelece a necessidade de se aditar a renovação das concessões. Após 10 anos de rádio e 15 de TV coloca-se a necessidade de se rever os critérios e as exigências. O Decreto 88.066/83 traz as cláusulas atuais, que devem ser alteradas, adequando as que definem os critérios para a renovação", defendeu Erundina.

Segundo Jonas Valente, tais pontos contribuiriam para que as emissoras cumprissem sua função de serviço público. O representante do Intervozes também apresentou um Termo de Compromisso Público elaborado pelas organizações que objetiva estabelecer acordos com as emissoras em relação a princípios de atendimento do interesse público [veja aqui ].

Abert diz que emissoras não precisam atender “todo o público”

O consultor jurídico da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), Alexandre Jobim, rebateu, diferenciando as responsabilidades dos três sistemas previstos na Constituição Brasileira. "Os concessionários comerciais não precisam atender todo o público, uma vez que pertencem ao sistema privado", argumentou. "Embora haja três sistemas, a radiodifusão é serviço público e, portanto, precisa haver mecanismos institucionais que permitam ao público acompanhar a programação e opinar no momento da renovação", respondeu Jonas Valente.

Além das propostas das entidades, foram apresentadas inúmeras denúncias de violações dos direitos humanos pelas emissoras, casos de desrespeito flagrante às exigências legais atuais e de negligência por parte do Ministério das Comunicações [veja aqui ]. Jobim, da Abert, alegou que não poderia respondê-las, por tê-las recebido naquele momento, mas afirmou que não compactuava com todos os desvios e distorções cometidos por emissoras de rádio e TV.

Alteração do marco legal

Os participantes não se ativeram apenas à análise do Executivo e propuseram a mudança do marco normativo da radiodifusão brasileira [veja aqui as propostas apresentadas pelas entidades ]. "A lei atual, de 1962 é de um anacronismo inútil. É um cadáver insepulcro e não se sabe exatamente o que fazer com ela. É ela que regula", enfatizou veementemente o professor da Universidade de Brasília Murilo Ramos.

Em resposta, a deputada Luiza Erundina e os deputados Walter Pinheiro (PT-BA) e Jorge Bittar (PT-RJ) defenderam a realização da Conferência Nacional de Comunicação. "A Conferência Nacional de Comunicação pode dar ao governo o respaldo popular para promover a iniciativa legal que pode criar esse novo aspecto legislativo que permita botar o dedo na ferida", defendeu Pinheiro, presidente da CCTCI. "Este debate deve apontar algo que precisa culminar com uma Conferência Nacional, que aponte para um marco legal que possibilite a democratização dos meios e o controle social para que o patrimônio público seja apropriado pelo povo", acrescentou Luiza Erundina.

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