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“No governo do PCB, privatizações do setor de telecomunicações seriam revistas”

2010_ivan_thumbO Brasil vive, no campo da comunicação, um atraso histórico: o Código Brasileiro de Telecomunicações é de 1962; nosso arcabouço regulatório para o setor não alcança os desafios dos modelos e práticas de comunicação social que emergem a partir da intensificação do uso da Internet e da convergência dos meios; a sociedade brasileira até hoje espera pela regulamentação do capítulo “Da Comunicação Social” da Constituição Federal e as práticas monopólicas se intensificam, na falta de marcos legais e compromissos políticos que assegurem a comunicação como um direito e seus meios, como bens públicos comuns. No que diz respeito à Internet, o país tem um significativo hiato a enfrentar, especialmente em relação à universalização da banda larga e à adoção de políticas que fomentem a apropriação das tecnologias digitais de informação e comunicação pelo cidadão e pela cidadã para o exercício de direitos e em prol do desenvolvimento humano e social.

Apesar de algumas conquistas recentes – como a realização, em 2009, da 1ª Conferência Nacional de Comunicação (Confecom) –, o Brasil ainda está muito longe da realidade de um Estado capaz de garantir direitos fundamentais e privilegiar o interesse público no campo da comunicação. Diante deste cenário, consideramos essencial compreender se há compromisso político dos candidatos à Presidência da República com relação ao direito à comunicação – e se há, em quê extensão – como elemento indispensável para o aprofundamento da democracia no país. Por isso, o Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social, através do Observatório do Direito à Comunicação, e o Instituto Nupef, através da revista poliTICs, realizam esta série de entrevistas com os/as candidatos/as à presidência.

O mesmo conjunto de questões foi enviado a todos/as as coordenações de campanha, na mesma data. A ordem da publicação das entrevistas respeita a ordem de chegada das respostas às nossas redações.

Veja as respostas enviadas pelo candidato do PCB, Ivan Pinheiro:

Confecom e Marco Regulatório
Em dezembro de 2009, a 1ª Conferência Nacional de Comunicação contou com a participação de empresários, sociedade civil e governo e aprovou mais de 600 resoluções. Em julho de 2010, o governo federal criou um GT Interministerial para propor uma revisão do marco regulatório das comunicações. O/A candidato/a pretende dar prosseguimento à revisão do marco regulatório e como seriam incorporadas, neste processo, as resoluções da Confecom?
Ivan Pinheiro –
Nosso governo não cederia à gritaria de empresários, como ocorreu. Não faríamos concessões, não colocaríamos a grande maioria das 600 resoluções em “letra morta”, mera conversa para boi dormir. A revisão do marco regulatório seria fato, não debate ou discurso pra enganar ou acalmar setores inocentes dos movimentos sociais. faríamos uma nova conferência, sem a participação do setor empresarial, e levaríamos as resoluções à cabo. Simples assim.Isso é poder popular, isso é democracia como a entendemos.

Conselho Nacional de Comunicação e controle social
O/A candidato/a se compromete com a criação de um Conselho Nacional de Comunicação, órgão participativo que garanta o exercício do controle social da comunicação no Brasil deliberando sobre políticas públicas do setor e acompanhando as atividades na área da comunicação, conforme resolução da Conferência Nacional de Comunicação?
I.P. –
Assino um documento com esses princípios na hora que me apresentarem, sem o subterfúgio covarde de criar GTs interministeriais para deixar a discussão morrer com o tempo…

Rádios Comunitárias
Tendo como base os parâmetros da liberdade de expressão, a Organização do Estados Americanos (OEA) recomenda ao Brasil a revisão da legislação no que se refere à punição penal aos comunicadores comunitários. O candidato pretende seguir esta orientação internacional? Qual sua posição sobre a anistia para os condenados por crime de radiodifusão não autorizada?
I.P. –
Como todo documento que integra interesses burgueses, essa recomendação da OEA é tímida e incompleta. Mesmo assim, é muito mais avançada do que vemos hoje em dia no Brasil. Em nosso governo, o direito à criação e difusão de noticiário sob interesse popular seria estimulado. Complementando, seria a favor da anistia.

Sistema público de comunicação
Nos últimos 4 anos, o governo transformou sua estrutura de comunicação com a criação da Empresa Brasil de Comunicação. Qual é a sua avaliação sobre o papel cumprido pela EBC e o que pretende fazer para fortalecer a comunicação pública durante a sua gestão?
I.P. – Como diz o ditado popular, não se pode servir a Deus e ao Diabo ao mesmo tempo. É chacota afirmar que o governo quis fortalecer o sistema público de comunicação quando vemos os processos de renovação das concessões de rádio e TV. A EBC não cumpriu o papel nem de ter um jornalismo independente muito menos o de promover entretenimento acessível com qualidade. Aliás, por que não nos integramos ao projeto Telesur? Por que não firmamos convênios com outras TVs públicas de nosso continente? Por que a linha editorial dos programas jornalísticos de nosso sistema público de rádio e TV mantém os preceitos do pensamento único? Por que não priorizamos a criatividade regional de nosso extenso país para afirmar valores como o altruísmo e a solidariedade em nossa população? Em nosso governo, essas coisas seriam o princípio fundamental de qualquer ação no ramo das comunicações.

Monopólio e capital estrangeiro
Que papel deve cumprir o Estado brasileiro para evitar a concentração da propriedade e regular a presença do capital estrangeiro no setor das comunicações?
I.P –
Ter a coragem de barrar essa realidade. Ter interesse político. Ter projetos. Ter o que dizer à população, com qualidade e salários dignos para os profissionais que trabalham nas comunicações públicas. Nada do que temos visto ao longo das últimas décadas…

Universalização da banda larga
O acesso à banda larga no Brasil é hoje limitado a 21% das residências, e os brasileiros pagam muito caro por um serviço ruim – mais de 54% das nossas conexões “de banda larga” têm velocidades nominais abaixo de um megabit por segundo, o que impossibilita um uso pleno das possibilidades que a Internet hoje oferece. Como o/a candidato/a pretende enfrentar o desafio de universalizar a banda larga no país e aprimorar a qualidade deste serviço? Quais os planos do/a candidato/a com relação ao Plano Nacional de Banda Larga, recentemente criado pelo governo federal?
I.P –
As privatizações do setor de telecomunicações seriam revistas. Iríamos reestatizar o setor, e não privilegiar interesse privados de criar uma megaempresa sob interesses capitalistas, como no recente caso da Oi. Somente indo contra os interesses privados conseguiremos democratizar o acesso a esse serviço, cada vez mais importante, o que Lula nem de longe fez. Após a estatização completa do setor, e com base de insumos e instrumentos de que já dispomos, seria criado um plano público de expansão do setor. É preciso afirmar, em todo caso, que isso não significa um PC com banda larga em cada domicílio do país. temos outras prioridades, mais custosas até, como a universalização do saneamento básico, da possibilidade de ingresso no ensino superior público e do direito ao trabalho. Mas todos, nem que fossem em centros comunitários, teriam acesso ao serviço a um custo subsidiado.

Governança da internet
O Brasil é hoje reconhecido internacionalmente por seu modelo de governança da Internet. Qual sua opinião sobre o papel do CGI.br e do NIC.br para o desenvolvimento da Internet no país? Que ideias o/a candidato/a tem sobre o futuro destas entidades?
Após a revisão de seus princípios e valores de funcionamento, que passariam a estar a serviço dos interesses populares, esse instrumentos seriam fortalecidos. Precisamos ter o domínio de fato, e não a mera ilusão deste domínio, sobre os dados, instrumentos de funcionamento e serviços presentes no mundo virtual. Nossa capacidade de criação, nossas informações, não passarão por back-up nos órgãos de inteligência dos interesses imperialistas.

Marco Civil da Internet
Qual a opinião do/a candidato/a sobre o Marco Civil da Internet no Brasil, e como o/a candidato/a vê o papel do Estado no estabelecimento de parâmetros que garantam direitos fundamentais na Internet?
I.P. –
O debate deve ser democratizado, pois afeta a todos mas está restrito à pequenos públicos e grupos de interesse. De qualquer forma, somos contra qualquer “gritaria” privada que veja “dirigismos” em qualquer iniciativa de regulamentação do setor.

Lei de Direitos Autorais
O país hoje discute a reforma da Lei de Direitos Autorais, com uma proposta do MinC que tem o intuito de equilibrar a proteção dos autores com o direito da sociedade de acessar de forma mais ampla os bens culturais produzidos. Qual a opinião do/a candidato/a quanto a esta proposta?
I.P. –
A proposta é tímida e tenta a conciliação entre entes diametralmente divergentes, como quase tudo nesse governo. E o resultado, como de sempre, deve ser o mesmo: conciliação extrema com os interesses do Capital e de entes privados. As ciências, é fundamental e óbvio que se diga, só avançam com compartilhamento de informações, conhecimento dos caminhos percorridos, dos acertos e até dos erros. Num governo comunista, o conhecimento é de todos, a cultura é de todos, bem como a dignidade das condições de vida – seja de operários, seja de intelectuais que produzem conhecimento.

Software livre
A política brasileira em relação ao software livre e à adoção de padrões abertos e interoperáveis também repercute positivamente em nível internacional e representou avanços para o país em termos de inovação tecnológica, transparência, entre outros aspectos. A política de priorizar software livre, padrões abertos e interoperabilidade será continuada?
I.P. –
Muito mais do que utilizar softwares livres, o que vamos manter nos órgãos/empresas/ serviços públicos, é preciso ter uma política de desenvolvimento e inovação tecnológica em nosso país, algo que ultrapasse a antiga lógica de “substituição de importações”, para fazer uma comparação com nosso passado histórico. Nossa população é inventiva, criativa, e pouco utilizamos isso a favor de soluções tecnológicas que deem conta de nossas necessidades. Isso ocorrerá através de investimentos maciços em nossas universidades e centros de pesquisa públicos. Isso extrapola em muito o que vem sendo feito, a mera propaganda oficialesca de instalação de centros de pesquisa em terrenos onde só o que cresce são matagais…

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Veja entrevistas com demais presidenciáveis:

Plínio de Arruda Sampaio – “Um governo do PSOL buscaria implementar todas as resoluções da Confecom”

 

Foram convidados a participar deste Especial, mas ainda não enviaram respostas:

Dilma Roussef (PT)

José Serra (PSDB)

José Maria Eymael (PSDC)

Levy Fidelix (PRTB)

Marina Silva (PV)

Rui Costa Pimenta (PCO)

Zé Maria (PSTU)

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Convergência tecnológica é tema do primeiro volume de série de especiais

"A Convergência Tecnológica e o Direito à Comunicação" é o primeiro de uma série de especiais realizados pelo Observatório do Direito à Comunicação como forma de contribuir para a reflexão sobre grandes temas do setor, em especial, no momento que antecede a realização da 1ª Conferência Nacional de Comunicação (Confecom).

O especial traça um histórico do processo de convergência tecnológica e ressalta que este vai além das novas funcionalidades técnicas que a cada dia se apresentam aos usuários – produtores e consumidores – das várias mídias. O especial ressalta que a convergência envolve a reconfiguração completa das comunicações e dos processos de produção, armazenamento e circulação da informação e da cultura.

Nesta reconfiguração, abrem-se possibilidades positivas e negativas em relação à garantia do direito humano à comunicação. Por esta razão, o especial atenta às diversas facetas da convergência, da reestruturação dos grandes atores do mercado nacional e internacional às possibilidades técnicas que, bem direcionadas por novos marcos regulatórios apropriados, podem levar à democratização das mídias, tanto em relação à propriedade dos meios quanto na multiplicação dos produtores de comunicação.

Série Debates Fundamentais – Observatório do Direito à Comunicação
A Convergência Tecnológica e o Direito à Comunicação

Pesquisa e redação: Jonas Valente
Assistente de pesquisa: Luanne Batista
Revisão: Bia Barbosa
Projeto gráfico e diagramação: Henrique Costa
Novembro/2009